andando pelo Viaduto do Chá numa quinta-feira pela manhã, pisei num manuscrito surrado escrito à pena. Era um pequeno dicionário. Datava de um dia antes e tinha alguns borrões, talvez pelas lágrimas do proeminente escritor que se emocionara enquanto marcava o papel com sua tinta. Na contracapa, no canto inferior esquerdo, sobre linhas abaixo de um se encontrado favor devolver a, permanecia também borrado um grande nome: Ubaldo Domínguez Inffamio de Marinho.

Algumas páginas estavam marcadas por rasgos em formatos de pinos redondos. Salvei o que restava e transcrevi para a rede mundial de datilografia:

Assopradores de apito

Incumbido de mandar, doutrinar e esbravejar contra os trabalhadores da bola, os assopradores de apito representam a autoridade no gramado. O movimento de 64 garantiu aos juízes total liberdade para: agir conforme manda sua emoção momentânea, incluindo a relativização das regras que regem o esporte; coibir padrões morais inadequados, como palavrões, retiradas de camisa, comemorações (principalmente quando o trabalhador se dirigir aos populares para comemorar o tento); utilizar o VAR (ver VAR) como base para as relativizações citadas no início deste verbete; total e irrestrita atribuição para seguir as tendências do time mandante. Convém também dizer que seu despreparo e a opção que escolhemos de manter-los na informalidade são importantes para manter suas atribuições, afinal, as garantias e direitos trabalhistas por vezes tornam o profissional preguiçoso.

Copo

O copo arremessado pode marcar o o couro cabeludo como um carimbo; assassinar o jogador de maneira mórbida no palco de grama, em frente aos cinquenta ou quarenta mil consumidores.

Camisa

A camisa, quando retirada, esconde os verdadeiros titulares, os que compram títulos com títulos, que vivem adesivando os ombros e números. Imoralidade? Nem se fala, destruindo o tripé sagrado, o trio homem, mulher, criança, a formação sagrada. Sem camisa, urrando como animais, o baixo calão impregnado em seu vocabulário.

Mão em formato de concha na orelha, A

Essa mão é terrível. Mistura de ódio, soberba e subversão. Confirmado o tento, o indigesto jogador cativa a violência com seu gesto provocador; torna-se cada vez mais urgente o controle destes indivíduos pelos amarelismos. Também aplica-se a mesma sentença ao repugnante ato do

Dedo indicador erguido contra os lábios

Além da bruta falta de higiene (mal se sabe por onde esses apontadores caminharam, e eles são muito utilizados para conter coceiras na cavidade anal), tal atitude é a mais clara submersão no mar do desrespeito. Aos padrões normativos, aos consumidores que ali têm de lidar com o ato repugnante.

Pisca-pisca

Importante frisar que, mesmo sendo alvo de propaganda subversiva, tal artefato passa longe do inofensivo. Muito utilizado pelos terroristas que desedenhavam da Revolução (e ainda desdenham), esses explosivos de calibre qualificado podem causar queimaduras e mortes. Poder-se-ia sentenciá-los ao veto amplo, total e irrestrito.

Arenas

Tal qual o movimento político que sustentou a Revolução e este manifesto, arena é símbolo de dignidade e honra no esporte bretão. Os altos valores praticados, além de evitar populares e badernistas, selecionam as famílias que mais merecem adentrar ao certame.

Jogo-justo

Os ingleses – a verdadeira pátria das chuteiros – nos trouxeram com sua elegância o futebol. Foram particularmente obsequiosos, solíticos e prestimosos. Nos deixaram jogar com suas bolas. Indianos e palestinos, primos de segunda classe, poderiam ter sido mais agradecidos. Não há atitude mais nobre que o fair play, o jogo-justo. A ética pertence aos cavaleiros, e, como cavaleiros que vestem suas armaduras e defendem a távula com suas vidas, os jogadores carregam nas pontas dos dedos do pé os valores da Nação. São inaceitáveis os caicaísmos, as ludibriações do adversário, os mal caratismos à esmo, as deixadas no vácuo, as cuspidelas, as soladas e os carrinhos proporcionalmente atrasados.

 

Este dicionário será atualizado conforme o autor for decifrando os manuscritos do sr. dr. Marinho.

Mador Cofunhamade é escritor e idealizador da Saci

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